Caracterização química e avaliação do potencial antimicrobiano de ceras epicuticulares foliares de espécies da caatinga

Abstract

A cera epicuticular representa a face mais externa da epiderme interagindo com os agentes de natureza biótica e abiótica na superfície das plantas. Quimicamente, as ceras (epi e intracuticulares) são formadas por constituintes alifáticos de cadeias longas e por compostos cíclicos, os quais são os principais responsáveis pelas funções desempenhadas pela cutícula, como a proteção da planta contra a perda excessiva de água durante a transpiração cuticular. Todavia a composição e a ultraestrutura dos constituintes cuticulares revelam outros papeis importantes como a proteção contra o excesso de radiação solar e a prevenção contra insetos herbívoros e outros patógenos, principalmente os fungos. Os estudos sobre potencial antimicrobiano de ceras epicuticulares são desenvolvidos há décadas, sobretudo, nas espécies de importância agronômica. Várias espécies da Caatinga já foram investigadas quanto ao seu potencial antimicrobiano. Todavia, o potencial antimicrobiano baseado em constituintes de natureza cuticular é ausente até a presente data em plantas nativas. Os objetivos deste trabalho foram quantificar e identificar a composição química das ceras epicuticulares de Allamanda blanchetii (Apocynaceae), Aspidosperma pyrifolium (Apocynaceae), Cynophalla flexuosa (Capparaceae), Jatropha mutabilis e Croton heliotropiifolius (Euphorbiaceae) ocorrentes na Caatinga, bem como avaliar o potencial antimicrobiano dos constituintes. A quantificação e identificação dos constituintes químicos das ceras epicuticulares foi realizada através de cromatografia gasosa e espectrometria de massas. Os ensaios antifúngicos foram realizados frente à Alternaria alternata, Fusarium oxysporum e Colletotrichum gloeosporioides, fungos fitopatogênicos de importância agronômica mundialmente. Para este propósito foi determinada a Concentração Inibitória Mínima (CIM) e a avaliação do efeito das ceras epicuticulares no crescimento micelial em meio sólido. Os extratos cuticulares também foram testados frente à cepas bacterianas de importância clínica como Bacillus subtilis, Staphylococcus aureus, Klebsiella pneumoniae, Pseudomonas aeruginosa, Escherichia coli e Serratia sp. Nestes ensaios, foi utilizado o método de microdiluição em caldo e a Concentração Bactericida Mínima (CBM) foi determinada por subcultivo em meio sólido. Os principais constituintes identificados na cera foliar das espécies foram triterpenos e n-alcanos. Álcoois primários, ácidos graxos, tocoferóis, fitoesteroides e alcaloides foram identificados em menores proporções. Nenhuma inibição significativa do crescimento micelial em meio sólido foi observada, porém, a germinação dos esporos de C. gloeosporioides foi inibida por quatro extratos testados no ensaio de microdiluição, sendo o extrato de A. pyrifolium (128 μg/mL) e J. mutabilis (256 μg/mL) os mais ativos com inibição de 100%. Nenhum dos extratos testados até 1024 μg/mL inibiu a germinação dos esporos de F. oxyspoum. Sobre os testes antibacterianos, o extrato de J. mutabilis apresentou baixa atividade contra B. subtilis na concentração de 1030 μg/mL, seguido por A. blanchetii (6180 μg/mL) contra E. coli. Do ponto de vista químico, as espécies com maior atividade apresentaram como compostos majoritários os triterpenos lupeol (A. pyrifolium), os ácidos ursólico e oleanólico (A. blanchetii) e uma mistura de lupeol e lupenona (J. mutabilis). Esses achados ampliam o conhecimento da diversidade química cuticular de algumas plantas na Caatinga, bem como o potencial antimicrobiano de triterpenos cuticulares de algumas espécies aqui estudadas.