Uma investigação sobre a prática de um professor de ciências no contexto de uma sala bilíngue para surdos em Recife

Abstract

A educação de surdos no Brasil foi historicamente marcada pela hegemonia ouvinte, que tentou suprimir a língua de sinais. Com os movimentos da comunidade surda por direitos linguísticos e por inclusão educacional, houve uma inserção progressiva no sistema de ensino. Este estudo investigou a eficácia da sala bilíngue como política pública na formação científica de estudantes surdos em aulas de Ciências da Natureza, fundamentando-se em autores como: Ribeiro (2020, 2024), Santana (2019, 2021, 2024), Quadros (2006, 2004, 1997), Perlin (1998, 2014), e Fernandes (1999, 2009, 2003, 2006, 2011, 2014). O lócus da pesquisa foi uma sala bilíngue localizada em Recife-PE, tendo como participantes um docente de ciências e três estudantes surdos regularmente matriculados no 9o ano dos anos finais do Ensino Fundamental. A metodologia qualitativa utilizou triangulação de dados por meio de: análise da prova do Sistema de Avaliação Educacional de Recife (SAERE), entrevistas com professor e alunos, e observações de aulas semanais durante um trimestre. Esse processo permitiu uma análise aprofundada das estratégias pedagógicas no ensino de Ciências para surdos, fornecendo uma compreensão contextualizada das práticas educacionais. Como resultado, o estudo revelou desafios significativos na educação de estudantes surdos, principalmente a escassez de professores de Ciências fluentes em Libras, evidenciando uma disparidade entre as diretrizes oficiais e a realidade escolar, com o professor atuando sem formação específica adequada. Diante dessa limitação, o professor demonstrou preocupação em desenvolver estratégias adaptativas, incluindo o uso intensivo de recursos visuais, criação de sinais temporários para conceitos científicos e implementação de avaliações adaptadas, embora a heterogeneidade dos estudantes represente um desafio adicional significativo. O SAERE apresenta limitações consideráveis para alunos surdos, caracterizadas pela ausência de adaptações adequadas. As questões analisadas demonstram o uso de alguns recursos visuais, no entanto, há ainda espaço substancial para melhorias na contextualização e no detalhamento dos conteúdos. Identificou-se uma distância significativa entre o conteúdo avaliado pelo SAERE e o efetivamente trabalhado em sala de aula, exigindo constantes adaptações curriculares por parte do professor. Os resultados das avaliações diagnóstica e formativa revelam desempenho predominantemente baixo dos alunos surdos, com variações significativas entre diferentes habilidades, evidenciando a necessidade urgente de intervenções pedagógicas e acompanhamento individualizado. A ausência de formações continuadas específicas para a educação de surdos constitui um obstáculo fundamental. Para superá-lo, faz-se essencial uma efetiva mudança paradigmática que transcenda adaptações superficiais, reconhecendo a língua de sinais como um sistema linguístico complexo e valorizando as especificidades culturais da comunidade surda. Somente por meio dessa transformação será possível promover uma educação que não apenas inclua, mas potencialize o desenvolvimento integral dos estudantes surdos, garantindo-lhes pleno acesso ao conhecimento científico.