Para não deixar a casa cair! : curso de vida, experiência e implicação nas práticas de cuidado profissional com usuários/as de drogas de um Centro de Atenção Psicossocial da Região Metropolitana do Recife

Abstract

O trabalho apresenta resultados de uma pesquisa etnográfica que teve por objetivo investigar o curso de vida de profissionais de saúde na caracterização da resposta governamental ao agravo, Vulnerabilidade Programática (VP), de usuários/as de álcool e outras drogas (AD) em um Centro de Atenção Psicossocial em Álcool e Drogas da Região Metropolitana do Recife, Pernambuco. Para atingir os fins do estudo, foi realizada observação participante no serviço e na Rede de Atenção Psicossocial do município, e entrevistas com doze profissionais (nível médio e superior) visando construir seus percursos biográficos. Os dados sugerem que, no caso em estudo, a VP se revela em dois níveis: 1) Organizacional: Descrita pelos interlocutores como sucateamento, e envolve a carência de recursos financeiros para a manutenção do serviço e precariedade das relações de trabalho; 2) Pessoal: Constituída ao longo da vida do profissional, é caracterizada por: a) presença de estigma, periculosidade e marginalidade constituídos mediante as redes de significação da sociedade e contato com o abuso de AD na família, ou enquanto usuário, anterior à entrada no serviço, b) incapacidade da educação formal de resignificar o objeto e ofertar recursos teóricos-técnicos para atuação, o que se revela na ausência inicial de desejo dos/as profissionais em trabalhar com AD por conta do estigma, e é sinalizada na expressão cair de paraquedas; c) precariedade de estratégias de requalificação de conhecimentos, técnicas e implicações dos/as profissionais, de modo a ampliar a efetividade da atuação profissional. Ainda assim, a inserção no serviço possibilitou, para muitos, a ressignificação de AD, construindo implicação empática no cuidado, que pôde ser ampliada para familiares dos/as profissionais. No entanto, o paradigma da Redução de Danos, que embasa a normativa do serviço exige outros componentes, os quais para serem agregados nos recursos técnicos dos/as profissionais exige formação e treinamento apropriados. Em síntese, o trabalho enfatiza a centralidade das implicações organizacionais e pessoais na reprodução de estigmatização e na produção da VP no campo da atenção em saúde no que se refere aos problemas decorrentes do uso de AD, sinalizando a importância de investimento na educação permanente em saúde, em um formato que considere a qualificação teórica e técnica, mas também a subjetividade do profissional, que podem interferir significativamente na produção do cuidado.