Urbanismo tático e direito à cidade : a transformação da relação da criança com o espaço público na Vila Burity

Abstract

A presente dissertação teve como objetivo analisar como o programa Mais Vida nos Morros — MVM —, implementado na comunidade da Vila Burity, no bairro da Macaxeira, em Recife (PE), transformou a relação das crianças com o espaço público urbano em que estão inseridas. Para tanto, realizamos um estudo de caso naturalista, único e instrumental, amparado em uma orientação construtiva e uma abordagem qualitativa e descritiva. Os dados e informações foram coletados através de levantamentos documentais, entrevistas semiestruturadas com moradores locais e observações não participantes durante incursões a campo. A interpretação e análise dos dados e informações se deu por meio de uma combinação entre as técnicas de agregação categorial e análise qualitativa básica, de modo que os achados foram codificados e posteriormente classificados em quatro categorias, a saber: (i) processo de intervenção, (ii) participação infantil, (iii) consequências da intervenção e (iv) oportunidades de aperfeiçoamentos. Em síntese, os resultados indicaram que o MVM realizou diversas intervenções pautadas nos princípios do urbanismo tático, criando, por exemplo, áreas de lazer e convivência direcionadas para as crianças, o que fez com que elas se reapropriassem dos espaços públicos, atribuindo vitalidade às ruas e calçadas e, por decorrência, aumentando, em certa medida, a sensação de segurança. Não obstante, os espaços de participação infantil criados pelo programa foram temporários, de forma que, decorrido algum tempo, as crianças voltaram a um status de invisibilidade, não tendo a oportunidade efetiva de exercer seus direitos, com destaque para o direito à cidade. Constatamos, portanto, que o MVM, a despeito de sua proposta ambiciosa, alcançou resultados aquém dos prometidos — e almejados — pelo poder público na Vila Burity, o que não significa que as iniciativas tenham sido um desperdício de esforços, mas implica dizer que elas deveriam ser regularizadas e reforçadas, numa rotina de trabalho contínuo. Com base nestes resultados, a pesquisa contribuiu com os estudos nas áreas da sociologia da infância, de políticas públicas e de planejamento urbano. Ademais, tecemos diversas sugestões de melhorias, visando subsidiar o aperfeiçoamento desta e de outras políticas públicas semelhantes, e recomendamos a realização de novos estudos em comunidades onde os níveis de engajamento foram diferentes, buscando identificar fatores influenciadores de sucessos ou de fragilidades.